Research Brief
Reflexão crítica sobre a formalização das empresas em Moçambique
Apesar dos esforços desenvolvidos a nível mundial para formalizar as empresas, a maioria continua a operar informalmente. Dados recentes de 2022 indicam que 8 em cada 10 empresas a nível mundial continuam a ser informais. Os defensores das políticas de formalização na Organização Internacional do Trabalho (OIT) e na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) argumentam que estas beneficiam as empresas, os trabalhadores e os governos.
Em Moçambique, as microempresas (0–4 empregados) ganham pouco com a formalização, uma vez que esta não conduz a um acesso mais fácil ao crédito, a registos financeiros formais ou a negócios com empresas formais. Embora as pequenas e médias empresas (PME) beneficiem ligeiramente mais da formalização, o impacto global continua a ser mínimo
Para beneficiarem verdadeiramente, as empresas precisam de mais do que apenas o estatuto formal; devem também cumprir outros critérios económicos e sociais, tais como ter um historial financeiro ou uma rede social extensa, o que muitas empresas não conseguem
É improvável que a formalização gere receitas substanciais para o governo, porque muitas micro, pequenas e médias empresas (MPME) estão isentas de impostos ou têm poucos rendimentos
A prioridade deve ser dada a pacotes inovadores de apoio às MPME e à melhoria dos serviços públicos
No entanto, trabalhos de investigação recentes em Moçambique revelam a existência de benefícios limitados para as empresas e sugerem uma menor urgência na formalização de todas as empresas informais, defendendo, em vez disso, um apoio abrangente às micro, pequenas e médias empresas (MPME), tanto informais como formais, através de pacotes que combinam o acesso ao crédito e à formação empresarial. Os resultados de entrevistas qualitativas com proprietários de empresas informais em Moçambique indicam que as políticas governamentais de apoio à formalização devem ser acompanhadas de medidas para melhorar a prestação de serviços públicos nos Balcões Únicos (BAÚ), na Autoridade Tributária e no Instituto para a Promoção das Pequenas e Médias Empresas (IPEME).
O que é formalização?
A formalização envolve normalmente o registo das empresas e dos seus empregados junto dos organismos governamentais. Em muitos países, isto cria um continuum de formalidade, dado que as empresas podem registar-se junto de algumas autoridades e não de outras, em vez de uma simples distinção binária entre o estatuto informal e o formal.
Em Moçambique, a informalidade predomina. 90% das empresas e 80% da força de trabalho operam informalmente, contribuindo com 38% para o PIB. Um relatório sobre um inquérito às MPME no sector da indústria manufactureira realizado pelo Programa de Crescimento Inclusivo em Moçambique (IGM) mostra que cerca de metade destas MPME não possui qualquer registo estatal. Cerca de 35% estão registadas num município, mas não possuem registo fiscal nacional, enquanto 11% possuem registo fiscal, mas não pagam as contribuições para a segurança social dos trabalhadores. Este facto realça a formalidade enquanto espectro que vai da completa informalidade ao cumprimento integral de todos os requisitos regulamentares, incluindo os benefícios dos trabalhadores.
Os custos e os benefícios da formalização para as empresas
As empresas optam pela formalidade quando os benefícios, como os direitos legais, o acesso ao crédito e a capacidade de vender a entidades formais, superam os custos, como as taxas e as obrigações fiscais. Na economia informal, porém, nem todas as empresas podem pagar a formalização inicialmente, mesmo que ela venha a tornar-se lucrativa mais tarde. Nem todas as empresas podem pesar livremente os custos e os benefícios da formalização, uma vez que o acesso aos benefícios depende muitas vezes de factores adicionais, como o historial financeiro e as competências de literacia.
A investigação em vários países indica que o impacto da formalização é menos positivo do que o esperado. Uma meta-análise de 22 estudos encontrou apenas benefícios modestos, com mais de metade a não mostrar impactos estatisticamente significativos.
Um estudo recente sobre os custos e os benefícios da formalização para as indústrias manufactureiras moçambicanas suporta este resultado, mostrando que os benefícios da formalização, como o aumento do acesso ao crédito e do número de clientes, não se materializam entre as microempresas (que empregam menos de cinco trabalhadores). Apenas as pequenas e médias empresas (PME) com mais de quatro trabalhadores tendem a colher benefícios da formalização, embora marginalmente: o acesso ao crédito aumentou em 9 pontos percentuais e o número de clientes em 13 pontos percentuais, após a formalização. Além disso, um outro estudo sobre as mesmas empresas revela que a associação entre a formalidade e o desempenho da empresa não é causal: embora as empresas mais formais tenham receitas, valor acrescentado e produtividade do trabalho mais elevados, a relação é estatisticamente insignificante – o melhor desempenho é determinado pelas características subjacentes da empresa e não pela formalização em si.
Tendo em conta estas conclusões, os decisores políticos devem elaborar estratégias distintas para as microempresas e as PME, reconhecendo que a formalidade por si só não é suficiente. As melhorias podem incluir a ligação da formalização à serviços adicionais, como os programas de literacia financeira que, como se viu no Malawi, aumentam a utilização e a rentabilidade dos serviços financeiros.
FIGURA 1 | A elegibilidade das empresas para os sistemas fiscais em Moçambique
Adicionalmente, apenas 11% das MPME manufactureiras moçambicanas têm empréstimos bancários, indicando que a formalização não conduz tipicamente a um melhor acesso ao crédito. Para beneficiar verdadeiramente estas empresas, as condições de crédito devem ser mais favoráveis e as outras vantagens da formalização, como melhores oportunidades de negócio e serviços públicos, precisam de ser melhoradas.
Os custos e os benefícios da formalização para o governo
O registo das empresas envolve custos não só para a empresa, mas também para o Estado. No Benim, a despesa com a formalização das empresas excede a receita fiscal adicional que as empresas pagariam numa década inteira.
Facilitar o acesso ao crédito através de critérios de concessão de empréstimo bancário mais flexíveis.
Adaptar os programas de formação empresarial às necessidades contextuais, equilibrando as competências transversais e as competências técnicas.
Promover ligações entre empresas nacionais e internacionais.
Melhorar a qualidade dos serviços públicos, especialmente nos Balcões de Atendimento Únicos (BAÚ), na Autoridade Tributária e no IPEME.
Assegurar uma melhor aplicação da regulamentação empresarial para apoiar as empresas formais e informais.
Utilizar eficazmente os dados científicos de outros países africanos para criar pacotes bem-sucedidos de apoio às empresas que visem separadamente as microempresas e as pequenas e médias empresas (PME).
Em Moçambique, 63% das micro e das pequenas e médias empresas (MPME) no sector da indústria manufactureira estão isentas de impostos e 28% estão abrangidas por um sistema fiscal simplificado com impostos reduzidos (ver Figura 1); apenas 9% pagam impostos normais. A nossa amostra é relativamente formal, o que sugere que numa amostra representativa de empresas informais ainda menos empresas reuniriam os requisitos para ficarem abrangidas pelo sistema fiscal normal. Como a maior parte da economia moçambicana é composta por pequenos proprietários informais na agricultura e poucas empresas de serviços que acrescentam pouco valor, é improvável que as MPME noutros sectores beneficiem mais da formalização ou detenham mais receitas do que as do sector manufactureiro. Por conseguinte, as potenciais receitas da formalização das MPME são limitadas. O baixo potencial de receitas da formalização das MPME implica que os funcionários da Autoridade Tributária devem concentrar-se no cumprimento fiscal por parte das empresas de maior dimensão.
A economia informal deve ser vista como uma fonte crucial de emprego, especialmente para os jovens que lutam para entrar no mercado de trabalho formal. Em vez de se concentrar apenas na urgência da formalização e no potencial de receitas fiscais da formalização, o Governo deve adoptar uma abordagem integrada para aumentar os benefícios da formalização.