Policy Brief
Fechando a lacuna da protecção social na velhice
Simulações dos efeitos de uma pensão para cobertura universal de velhice em Moçambique
Moçambique apresenta instrumentos legais que visam directa ou indirectamente reduzir a vulnerabilidade das pessoas idosas. Com efeito, há cerca de duas décadas, o país aprovou através da Resolução n.º 84/2002 de 12 de Novembro, a Política para a Pessoa Idosa e a estratégia da sua implementação, aprovou a Lei n.º 3/2014 de 5 de Fevereiro que reforça os mecanismos legais de promoção e proteção dos direitos da pessoa idosa, definindo o idoso como “todos os cidadãos com idade superior a 60 anos”, e aprovou, ainda, a Lei nº 4/2007, de 7 de Fevereiro, que define as bases nas quais se assenta e organiza o Sistema de Segurança Social da República de Moçambique.
Quase metade dos idosos em Moçambique não recebem nenhum tipo de pensão através do sistema nacional de protecção social, seja tanto no pilar contributivo como não contributivo.
No cenário em que o valor do benefício é igual a 100% da linha de pobreza, a introdução de uma cobertura universal de velhice em Moçambique pode reduzir a pobreza em 3,2% e a desigualdade em 1,1%.
O benefício simulado gerou impactos em toda a distribuição dos rendimentos, com maior destaque para os efeitos sobre os agregados familiares mais pobres, sobretudo aqueles abaixo da linha da pobreza em Moçambique.
Dados demográficos do Instituto Nacional de Estatística (INE), sugerem que em 2019 havia cerca de 1.275.660 idosos no país (4,8% da população). Destes, cerca de 51% não recebem nenhum tipo de pensão, seja do sistema contributivo ou não contributivo. A Figura 1, a seguir, mostra a cobertura da segurança social para as pessoas idosas.
Esta nota de política tem como objetivo avaliar o impacto de diferentes cenários para introdução de uma pensão aos idosos em Moçambique sobre os níveis de pobreza e desigualdade do país, bem como o espaço fiscal necessário. A cobertura universal abrange os idosos que não estejam beneficiados por outros tipos de pensão. Neste caso, o benefício pode ser entendido como uma cobertura universal mas não uma pensão universal de velhice, a qual atenderia a todos, independente de possuir ou não outro benefício. As simulações são realizadas através do “Modelo de Microssimulação de Impostos e Benefícios Sociais para Moçambique”, MOZMOD (v 2.7).
Figura 1: Cobertura da segurança social para as pessoas idosas, 2019.
Fonte: Castel-Branco e Vicente Andrés, 2019. ‘Rumo a uma Segurança Social Universal para a Pessoa Idosa em Moçambique’. https://www.social-protection. org/gimi/ShowRessource.action?id=55685
Nota: INPS é o Instituto Nacional de Previdência Social. INSS é o Instituto Nacional de Segurança Social.
Os cenários da política simulada
Para todos os cenários excluiu-se das simulações todas as pessoas que estão a receber rendimentos de pensões através do sistema de segurança social contributiva, incluindo as previdências públicas e privadas. Este procedimento se justifica, pois, a proposta analisada é de “fechar a lacuna”, isto é, proporcionar o acesso a uma pensão de velhice para todos aqueles que não dispõem de uma pensão. Além disto, define-se como idoso todas as pessoas com idade igual ou superior a 60 anos.
Cenário 1: Transferência monetária no valor de 540 meticais ao universo de pessoas idosas não abrangidas pelo Programa de Subsídio Social Básico (PSSB) e não beneficiadas pelos subsistemas de Segurança Social contributiva em Moçambique (INSS, INPS).
Nos cenários 2 e 3 são incluídos nas simulações todos os idosos, mesmo aqueles beneficados pelo PSSB. O único critério de exclusão são os idosos abrangidos por alguma pensão do Sistema de Segurança Social Obrigatória em Moçambique (INSS e INPS).
Cenário 2: Transferência monetária no valor de 681 meticais mensais a todos idosos. O valor simulado corresponde a dois terços da linha de pobreza actual corrigido pela inflação acumulada entre 2018 e Junho de 2021.
Cenário 3: Transferência monetária no valor de 908 meticais para todos idosos. Este valor é referente a 100% da linha de pobreza actual corrigido pela inflação acumulada entre 2018 e Junho de 2021.
Tabela 1: Simulação dos impactos da introducão de uma pensão ao idoso em Mocambique
Fonte: Elaboração dos autores com base nas microsimulações usando o modelo MOZMOD.
Notas: 1 – milhões de meticais por ano. Sem a política. A suposição adotada pelo modelo é que toda a renda adicional gerada pela transferência é consumida.
Pobreza e desigualdade diminuem significativamente com a introdução do benefício
A reforma simulada resultaria em aumento anual das despesas governamentais de 7,8 mil milhões de meticais no cenário 1, 10,2 mil milhões de meticais no cenário 2, e na implementação do cenário 3, o aumento seria na ordem de 13,7 mil milhões de meticais.
As simulações indicam que as reformas provocariam uma redução na incidência de pobreza em cerca de 1,8% no primeiro cenário, 2,5% no segundo cenário, e 3,2% no terceiro cenário. Além disto, nos agregados familiares com idosos, a redução da pobreza é de 10,9%, 15,5% e 20,3%, respectivamente.
O efeito das reformas das políticas no nível de desigualdade medido pelo índice de Gini aponta para uma redução do nível de desigualdade em 1,2% no cenário 1, 1,7% no cenário 2 e 1,9% no cenário 3.
Toda a distribuição dos rendimentos é beneficiada, com maiores impactos entre os mais pobres
Figura 2: Efeito dos cenários simulados da introdução de uma pensão a velhice sobre o consumo per capita do agregado familiar, após impostos e transferências
Fonte: Elaboração dos autores com base nas microsimulações usando o modelo MOZMOD.
Nota: a suposição adotada pelo modelo é que toda a renda adicional gerada pela transferência é consumida.
A Figura 2 sugere que o programa atinge principalmente os agregados familiares mais pobres e vulneráveis, sobretudo aqueles que estão nos percentis 20 e 40. O consumo médio mensal per capita no percentil 20 é de 7.489,00 meticais, enquanto no percentil 40 é de 12.880,00 meticais. Ou seja, nestes dois percentis o consumo médio está abaixo da linha de pobreza em Moçambique (15.111 meticais por mês), que se situa entre os percentis 40 e 50. Entretanto, os impactos sobre os percentis com nível de consumo mais elevados também são consideráveis.
As simulações sugerem que o aumento de renda no percentil 20 pode chegar a 4,8%, enquanto no percentil 80 a 2,8%.